por David H. Freedman, para a INC*
John Deal, cofundador e CEO da Hyperion Power Generation, oferece um dos produtos mais difíceis de comercializar no planeta – usinas de energia nuclear. E, no entanto, está vendendo muitas delas: já conseguiu fechar mais de 120 negócios. Sua tecnologia enfrenta barreiras regulatórias desanimadoras, não existe sequer em protótipo, é menos eficiente que outros projetos nucleares e vem de uma pequena empresa novata em Santa Fe, nos Estados Unidos, que compete com alguns dos nomes mais sólidos do mundo, incluindo Toshiba e Westinghouse.
O ponto forte do gerador da Hyperion é seu design pequeno, simples e seguro, que promete ser fácil de fabricar, enviar, instalar e operar. Parece-se mais com um grande motor a diesel do que um gerador nuclear convencional. Por cerca de US$ 70 milhões, uma usina Hyperion não é exatamente barata. Mas seu preço é uma pequena fração daquele de uma usina convencional.
SEMPRE EM VOO | John Deal, no Aeroporto Internacional de Denver, prepara-se para mais uma negociação. Ele começa a ler as notícias às 5h da manhã
Ver Deal lidar com seus clientes prospectivos é compreender que é preciso um grande vendedor para criar o desejo de comprar e superar uma tempestade de potenciais obstáculos. Mehar Karan Singh, investidor imobiliário e financista da área de saúde, que pretende levar eletricidade à Índia rural, sempre fica impressionado quando conversa com Deal: “Ele cria uma visão e então envolve as pessoas”.
Isso, na essência, é o que todos os vendedores deveriam fazer. Escutar mais que falar, compreender as necessidades do cliente, estar bem informado e outras máximas conhecidas formam a base do que Deal chama brincando de seu “reino do urso das vendas”. A diferença é que Deal executa essas regras básicas com uma visão e um dom extraordinários, contando com uma complexa mistura de talento, disciplina e improvisação.
Acompanho Deal em uma reunião em um hotel elegante de Londres, na Trafalgar Square. Deal, 46 anos, veste um colete de veludo sobre camisa e calça cinza. O fato de ele evitar o traje de negócios tradicional tem o objetivo de indicar sutilmente que é diferente dos assalariados abotoados que seus grandes concorrentes provavelmente terão enviado. “Eu não sou um gerente médio da GE, e quero que as pessoas saibam disso”, diz Deal.
Ele vai se reunir com Nic Barnes, executivo de TI do Mace Group, uma empreiteira de Londres com faturamento anual de mais de US$ 1 bilhão. Uma das especialidades da Barnes é construir centros de dados em grande escala, e ele está interessado em suprir as enormes exigências energéticas dessas instalações.
Barnes chega. É um sujeito simpático, com os modos simples que se poderiam esperar de um gerente de obras. Está usando terno. Deal leva a conversa imediatamente para as Olimpíadas de Londres de 2012, mas não é exatamente conversa mole: o tema é o que será construído para o evento, e essa linha de conversa rapidamente, e não por acaso, leva Barnes a descrever alguns dos projetos da Mace.
Mal se passam cinco minutos e Barnes está monologando sobre uma nova fábrica que a Mace construiu recentemente para a Rolls-Royce. Deal escuta durante muito tempo antes de finalmente fazer um comentário. “Parece que você quer mais do que construir prédios”, ele diz. Barnes responde com entusiasmo, explicando que a Mace está considerando maneiras de gerar sua própria energia, em vez de depender da companhia elétrica. “Você está pensando em fornecer mais segurança?”, Deal pergunta. Isso provoca ainda mais receptividade em Barnes, já que segurança no mundo dos centros de informações geralmente significa geradores a diesel em série e milhares de baterias de carro. Essa capacidade de backup custa milhões de dólares, apesar de às vezes serem usadas por apenas 15 minutos por ano — quando há uma falha de energia —, ou nunca.
“Deixe-me contar o que nós fazemos”, diz Deal. Apesar de a reunião ter começado há 45 minutos, é a primeira vez que ele se refere a sua empresa. Citando o nome de várias empresas britânicas e órgãos do governo com os quais a Hyperion tem relacionamentos, ele menciona alguns executivos, membros do conselho e assessores, incluindo a presidente da Autoridade de Energia Atômica do Reino Unido. Então, apresenta um rápido esboço de como os custos da eletricidade produzida por sua pequena usina, que não tem emissões poluentes, se acumulam favoravelmente contra os da energia eólica e solar — e não se sai mal em comparação com as grandes usinas nucleares e a carvão.
Deal faz um resumo rápido do funcionamento de sua usina nuclear: um reator do tamanho de uma sala é enterrado no subsolo, onde o combustível de urânio aquece o metal, que por sua vez aquece a água enviada para uma turbina convencional de geração de eletricidade a vapor na superfície. “Os detalhes são aborrecedores”, diz Deal. “Vou mandar a vocês um dossiê com todo o material técnico.” Esta será a desculpa de Deal para um próximo contato.
“A principal pergunta que você vai ouvir dos clientes”, ele continua, “será sobre segurança”. E acontece que esse é exatamente o ponto forte da Hyperion. Deal passa a descrever como as mininucleares oferecidas por outros concorrentes parecem “grandes chaleiras”, nas quais a água fervendo ao redor do miolo nuclear fornece resfriamento e calor com um “verdadeiro potencial de falhas”. No reator cheio de metal da Hyperion não passa a água da turbina. “Nosso reator é mais parecido com uma bateria”, ele diz. Os bandidos não podem chegar ao núcleo selado, e mesmo que conseguissem não poderiam fazer nada com o material fundido, de grau insuficiente para a produção de armas. “Não somos tão eficientes quanto as outras”, ele admite. “Mas quem se importa? Lidamos com maior segurança e temos um bom preço.”
Deal continua martelando na segurança. O reator é selado na fábrica e enviado para o local do cliente para ser enterrado. Ele funciona durante sete ou dez anos sem exigir manutenção. Outros reatores precisam de intervenção humana, e é aí que os acidentes ocorrem, observa. Depois que a unidade da Hyperion se gasta, os clientes podem trocar por um novo “cartucho” do reator, simplesmente deixá-lo enterrado ou mandar a Hyperion escavá-lo e levá-lo para reciclagem.
“Há muito calor disponível”, Deal diz a Barnes. “Isso é energia grátis, e a Mace poderia usá-la para montar uma empresa de tratamento de água.” Outra sugestão lucrativa: a maioria das usinas gera calor, e a oportunidade óbvia é fornecer calor para edifícios. Acontece que a água é uma das obsessões de Deal.
CRENÇA E PERSUASÃO | John Deal tem 46 anos e é neto de um ex-vendedor de peças da Ford que virou um pregador, fazendo sermões todos os domingos em cinco igrejas. O próprio Deal chegou a ser ordenado
Ele vê a energia nuclear como um meio para atingir um fim: abordar a falta de água potável que deixa grandes extensões do planeta mergulhadas na doença, na pobreza e até na guerra.
É uma obsessão que o levou em 2002 a fundar uma empresa de energia eólica no Novo México. Mas os ventos imprevisíveis, as dificuldades regulatórias e as objeções de muitos moradores às turbinas de vento sobre os morros desanimaram Deal e deixaram a empresa no limbo.
Foi quando ele conheceu Otis (“Pete”) Peterson, um cientista do Laboratório Nacional Los Alamos, no Novo México, que tinha o projeto de uma pequena usina nuclear. Deal não era um fã da energia nuclear, mas se perguntava se um gerador de pequena escala poderia ser a chave não apenas da energia verde, mas também da água potável. Esse equipamento poderia ser facilmente enviado e montado junto de qualquer pequena cidade, onde ficaria em segurança no subsolo, produzindo eletricidade barata — juntamente com calor para purificação da água.
A paixão sozinha não faz um produto andar. Muito mais importante é a capacidade de pensar criticamente, diz Eric Shaver, um ex-vendedor superstar de software. “Os grandes vendedores podem olhar para um cenário e analisar o que eles estão vendendo que poderia ter um impacto sobre o cliente. Eles descobrem como criar oportunidades que outros não conseguem ver” |
Barnes parece adorar a ideia de todo esse calor grátis, embora não esteja pensando na água potável. O calor, afinal, também pode ser usado para acionar unidades de resfriamento, o que significa que a usina da Mace poderia reduzir os enormes custos de resfriar os computadores de um centro de informática. “Eu não tinha pensado nisso”, diz Barnes. “Algum projeto em particular que você tenha em mente?”, pergunta Deal, sentindo o bom momento para encaminhar uma possível venda.
Barnes explica que uma grande e conhecida empresa americana está interessada em construir grandes centros de dados ao redor do mundo, e a Mace provavelmente erguerá um no Reino Unido. Deal pergunta quais seriam as necessidades elétricas e então calcula que a Mace precisaria de dois reatores. “Vocês provavelmente estariam na faixa de US$ 90 milhões ao todo”, ele diz. Deal fala de improviso que substituir a companhia energética e o backup convencional por sua usina nuclear reduziria os custos de energia da Mace em dois terços. Ele acrescenta que a usina é pequena o suficiente para ser isenta de algumas regulamentações do governo britânico, um detalhe que faz Barnes arregalar os olhos.
Deal balança a cabeça pensativamente. “Bem, estamos procurando projetos de destaque para nos lançarmos”, diz. “Um centro de dados pode ser perfeito para nós.” Deal levanta-se para encerrar a reunião. Enquanto acompanha Barnes até a porta, acrescenta: “Vamos decidir quem escolheremos nas próximas semanas. Preciso saber logo se você está no barco”.
Barnes parece contente em saber que pode ter convencido Deal a deixar que a Mace seja um dos primeiros clientes da Hyperion. “Vou marcar reuniões esta tarde”, ele afirma a Deal antes de partir.
Mais tarde, diante do hotel, eu vejo Deal encostado em um prédio, dando fortes baforadas em um cigarro. Não será a primeira vez que ele está nervoso. “Nos últimos três anos eu passei quase a metade do tempo na estrada, e a metade dele em viagens internacionais”, diz. “Acho difícil relaxar.” Eu penso que fazer uma venda parecer fácil dá muito trabalho para Deal.
A próxima reunião é com John Hutton, do parlamento inglês. Deal espera que Hutton possa se tornar um assessor de alto nível. Lançar uma usina Hyperion no Reino Unido vai exigir a aprovação da Inspetoria de Instalações Nucleares. Como a reunião será rápida, ele vai direto ao assunto: se o Reino Unido adotar a Hyperion, terá acesso a tecnologia de ponta por uma bagatela. Hutton não se impressiona. Deal diz que o lançamento na Grã-Bretanha seria apenas uma ponta de lança, que o verdadeiro mercado está em países menos desenvolvidos. O ângulo do Terceiro Mundo acende o interesse de Hutton. Por quanto tempo Deal vai ficar na cidade?, pergunta.
Mais tarde, Deal encontra-se com executivos de uma companhia britânica de defesa e propõe que a empresa se associe à Hyperion — e invista US$ 4 milhões. Um dos executivos pergunta por que sua empresa precisa da Hyperion, se já tem bons produtos de energia. “Nós deveríamos colaborar, não competir”, sugere Deal. Os executivos riem. Eles dizem que a Hyperion pode ser ágil, mas o processo regulatório não é. “Já nos disseram que vamos começar a avaliação em fevereiro de 2011”, responde Deal. Isso provoca trocas de olhares. Então, os executivos disparam uma série de perguntas técnicas. Deal faz um sinal para Mark Campagna, chefe de operações da Hyperion, que começa a soterrar os executivos em detalhes. Deal relaxa e desfruta do espetáculo.
Sentindo que os executivos estão ficando menos arrogantes, Deal começa a falar. “Muitos políticos acham que podemos liderar o renascimento nuclear nos Estados Unidos. Estamos lotados de encomendas, de vários países diferentes. Esta coisa foi projetada para ser aprovada. Temos por trás de nós US$ 200 milhões em pesquisa no Laboratório Nacional dos EUA. Os japoneses já gastaram US$ 1 bilhão em seu projeto. Quanto vocês pretendem gastar no seu?”
Ninguém fala durante vários segundos. Então um dos executivos limpa a garganta. “Acho que entendemos o que quer dizer. Quais são as oportunidades para nós?”
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